Através do espaço e do tempo

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Pai, ainda faltou tanta coisa a conversarmos. Havia tanto ainda que eu precisava aprender com você, tanto a compartilhar, tanto a sonhar, a viver. Agora, com quem vou dividir minhas ideias de viagens, de expedições e passeios? Quem vai abrir na mesa os mapas e o Google Earth no computador, e me mostrar as coordenadas marcadas e suas descobertas, feitas em horas e horas de pesquisa?

Desculpe ser egoísta, mas eu ainda precisava de você. Mas você se foi, e eu tenho tanta saudade, tanta. 

Já tenho saudade das nossas conversas sobre carros e todas as coisas mecânicas, coisa que acredito ter aprendido a apreciar com você. Sempre vou sentir muita falta dos links de vídeos que me mandava sobre ruínas a visitar, estradas a percorrer, lugares a conhecer. Embora fosse ansioso a chegar nos destinos, você era um viajante nato, sempre preparado e disposto a sair numa expedição. Acompanhando você, conheci as águas do Atlântico e Pacífico, viajamos pelas montanhas nevadas dos Andes, através das planícies secas, e pelas rodovias desse país Brasil e dos países vizinhos, desde que eu era só um bebê. E eu ainda queria viajar mais uma vez com você, pai. Você até queria que eu te levasse para conhecer a Ponte do Abunã, que finalmente iria se concluir, e eu prometi que o levaria quando você estivesse melhor disposto, mas essa promessa, não cumprirei. Faltou tão pouco, pai.

Uma pessoa tão criativa, engenhosa, meticulosa e detalhista, que não queria nada menos que o perfeito, é uma grande perda para a humanidade. Inteligente e culto, poderia ser facilmente um engenheiro ou um arquiteto, com seus desenhos manuais perfeitos, e era um líder, com seu vocabulário sempre eloquente, que podia ser visto nos discursos e textos que escrevia. Habilidoso com um martelo e uma plaina, ou com uma caneta e um compasso, e tantas coisas mais, eu sempre almejei ser talentoso como você foi. Acho que isso vai me impulsionar a evoluir cada vez mais, e quem sabe de onde estiver, ainda possa nos ver crescer...

Sentimos sua falta, de você, da sua presença, e do barulho da gaita ou do violão, soando tarde da noite do seu quarto lá no sítio, através da porta meio aberta. Sentimos falta do riso largo, da gargalhada, das piadas de pai, enfim...

Ainda queria que você pudesse conhecer minhas futuras crias, e eu queria que pudessem ter compartilhado muitos momentos juntos ainda. Queria que pudessem ganhar alguns dos seus brinquedos, feitos com tanto carinho por você, pois essas coisas não têm preço. Queria tantas coisas...

Nos prevenimos tanto da dor, refletimos tanto sobre a inevitável partida, procuramos nos conformar com o inconformável, mas nunca estamos realmente prontos para o adeus. Nas duas semanas seguintes à sua partida a sensação para mim era que você estava numa das suas viagens por aí, mas então a ficha começa a finalmente cair que essa última viagem foi realmente só de ida, rumo ao infinito e as estrelas, e embora seja irreal, eu gosto de pensar que nós, para usar o termo manjado, estaremos sempre vivos através do tempo e do espaço, e quem sabe nos veremos de novo, pois como já disse Carl Sagan, somos todos feitos de poeira estelar...

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